quinta-feira, 28 de março de 2013

Sócrates e a miséria da Filosofia

"O título "A Miseria da Filosofia" foi Karl Marx que o deu a um opúsculo no qual criticava a obra "A Filosofia da Miseria" do anarquista Proudhon. Mas neste caso significa apenas a miséria da filosofia que Sócrates aprendeu em Paris.
A filosofia distingue-se das religiões por lidar apenas com argumentos racionais. Ora, o que ontem se viu não foi bem isso.
Por exemplo, alguém racionalmente acredita que, mesmo com o PEC IV aprovado (e eu, na altura, defendi que o deveria ser), Portugal tivesse escapado ao resgate? Não creio. Essa ideia é um pensamento magico de Sócrates, algo a que se agarra, da mesma forma que um naufrago no mar alto vê a sua salvação no mais mísero toco.
Aprende-se, igualmente, na Filosofia que as pessoas desprendidas discutem ideias, as normais acontecimentos e as mesquinhas discutem pessoas. Dentro deste parâmetro, escuso de classificar o ex-primeiro-ministro (o atual vai pelo mesmo caminho, mas essa é outra conversa). Eu, que sou insuspeito de gostar do Presidente ou de achar que o seu papel tem sido positivo, registo que Sócrates diz que ele conspirou. Pois bem, quando era diretor do Expresso não foi de Belém que me chegou uma conspiração contra o Governo, mas do Governo que me chegou uma conspiração contra Belém. Na verdade, que interessa isso agora? Apenas nos dá conta do tipo de pessoas a que estávamos e estamos entregues.
Sócrates foi - como se dizia dos futebolistas - igual a si próprio. Parem a austeridade! exclama, não explicando como reduz o défice a que ele também se comprometeu no memorando da troika. Vitimiza-se, interrompe, coloca um ar superior enche a boca de si mesmo e fala muito da narrativa. O termo narrativa é interessante, porque parece introduzir uma relativização da verdade - como se várias narrativas coexistissem, sem que houvesse verdade e mentira. Mas há verdade e mentira e isso, como se aprende na Filosofia, não depende da vontade de Sócrates.
A demagogia, que é o terreno fértil dos tele-evangelistas, dos vendedores de facilidades, abundou. E apetece fazer as perguntas que o grande Cícero fez a Catilina, um demagogo da sua época: "Até quando Catilina abusarás da nossa paciência? Por quando tempo ainda esse teu rancor nos enganará? Até que ponto a tua audácia abusará de nós? Sem esquecer que Catilina foi considerado um herói popular e Cícero enviado para o exílio, de onde voltou para se retirar da política ao entrar em choque com Júlio César. A República Romana, que Cícero defendera acima de tudo, tinha chegado ao fim. Abria-se o ciclo dos imperadores.
A moral da história não é quase nunca uma história moral!"

Henrique Monteiro in Expresso

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