sexta-feira, 30 de março de 2012

domingo, 25 de março de 2012

A/c de todos quanto criticaram Cavaco, dizendo que ele ganha muto para as suas funções

Muita gente tem criticado Cavaco Silva, Presidente de todos os portugueses, devido a declarações proferidas por si, muitas vezes correctas no conteúdo mas vestidas de uma roupagem não muito apropriada. Tais declarações têm provocado uma série de comentários impróprios para com o Presidente, sobretudo da esquerda mas também da direita. Quem as profere, chega, no limite, a exigir a demissão do Presidente (???) e a afirmar que ele ( e todos os politicos em geral) deveria ganhar o ordenado mínimo.
Falando para a ala esquerda, um dos pensadores que devem atentamente seguir, penso eu, será George Bernard Shaw, escritor, dramaturgo, jornalista, ensaísta, irlândes do sec XIX e XX e que muito escreveu sobre o socialismo.
Bernard Shaw em " Um socialista associal" escreve sobre o Rei de Inglaterra " Um rei nos dias de hoje é apenas um boneco que serve para desviar as atenções dos verdadeiros opressores da sociedade e a fracção do salário que um rei pode gastar conforme lhe apetece é normalmente demasiado pequena para o risco que corre, para os problemas que enfrenta e para a situação de escravidão pessoal a que está reduzido. Que indivíduo em Inglaterra está em pior situação situação do que o nosso monarca constitucional? Negamos-lhe toda a privacidade. Ele não pode casar-se com quem escolher, ligar-se a quem preferir, vestir-se de acordo com os seus gostos, ou viver onde lhe apetecer. Não acredito sequer que possa inclusivamente comer ou beber o que mais gosta. O seu gosto por tripas e cebolas poderia provocar um protesto do Concelho Privado. Impomos-lhe tudo o que deve fazer, excepto os seus pensamentos e sonhos e até mesmo este tem de guardar para si próprio se, na nossa opinião, não forem adequados à condição que ocupa.".
Será a posição do Rei muito diferente daquela que a Constituição impõe a todos os Presidentes da Republica, especialmente a Cavaco Silva, porque a cumpre?!

sexta-feira, 23 de março de 2012

Teixeira dos Santos na PT - III

Teixeira do Santos na PT - II

" Que mundo tão parvo"

Teixeira dos Santos na PT - I

Com Teixeira dos Santos na PT, António Coimbra e Miguel Almeida respiram de alívio!

Há um ano

Aqui fica o que escrevi há um ano, quando Sócrates decidiu que não queria mais ser Primeiro Ministro.

Através de LPM

Retirado da página de Facebook de Luis Paixão Martins: " Para o caso de não terem dado por isso, a Assembleia da República (sob propostas do Partido Socialista e dos Verdes) apresta-se para aprovar a correr, a correr legislação que vai fazer com que acabam as emissões de Televisão para crianças. É que sem Publicidade não há Televisão. Compreendo a intenção, mas penso que os autores das iniciativas não compreendem as consequências. Ou, se calhar, compreendem - e daí a pressa e o segredo em que o processo está a decorrer."

O que não deve acontecer numa greve

Podemos ou não concordar com os motivos, os meios e o tempo em que se fazem as greves mas, felizmente, é um direito que assiste a todos os cidadãos.
Gosto de poder dizer e escrever sobre o que penso e  , da mesma forma que o faço, há outros que também o podem fazer, pela escrita, pela música, pela acção política ou, não trabalhando.
Cenas como as de ontem, em que jornalistas - a trabalhar! - são agredidos pelas forças policiais, são lamentáveis e mereciam a reprovação de Miguel Macedo.
Ao ver as cenas de ontem não pude deixar de recordar as cenas na Ponte 25 de Abril que funcionaram como o prenúncio da queda: as pessoas entendem alguns sacrifícios pedidos aos portugueses, porventura até os apoiam mas não esperem que os assimilem pela força.

quinta-feira, 22 de março de 2012

A licenciatura de Sócrates no Clube dos Pensadores

Joaquim Jorge, no Clube dos Pensadores, a dada altura sobre a licenciatura de Sócrates diz " Deixem o homem em paz , já chega. Já pagou em parte pelo que fez , perdeu as eleições ".
Não pode ser assim. Uma pessoa responde perante o eleitorado sobre factos políticos e responde perante um juiz sobre factos criminais, não se podem misturar as coisas.
Estranho é que Joaquim Jorge, no mesmo texto, refere " Há uma Justiça quando se é Primeiro-Ministro e há outra quando não se é? Também fica a ideia que quando se é Primeiro-Ministro consegue-se abafar e esconder debaixo do tapete alguns atropelos." e é contra esta justiça, aqui preconizada por mais um caso de Sócrates, que deveremos exigir reformas, permitindo um acesso igual de todos ao sistema judicial.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Um óptima notícia mas não embandeiremos em arco, vamos aguardar com a calma e serenidade que o momento e a vida de todos nós sugere que se mantenha.

Será?

terça-feira, 20 de março de 2012

Colectânea de musicas para enfrentar a crise II - III

Senhor, encolhi o país!

" Ser membro do PSD nestas alturas tem que ser um momento particular de perplexidade. Claro que me refiro àqueles membros do PSD que foram atraídos pela muito sui generis e portuguesa fusão de tradições políticas, que ia do liberalismo político à noção de que a política não esgota o campo do humano, até à consciência de que é obrigação do Estado garantir um quantum de justiça social, tudo isso fundido num partido com uma história que era o seu "programa não-escrito". Em momentos decisivos, em 1975, no PREC, na luta de Sá Carneiro contra a hegemonia militar pós-25 de Abril e pelo retorno a uma democracia civilista plena; em 1979, na vitória da AD e na materialização da alternância política; em 1987, com a maioria absoluta subvertendo um défice de governabilidade inscrito na Constituição; em 1989, na revisão constitucional que permitiu a reconstrução de uma economia privada fora do Estado, o PSD teve um papel central. Não me custa admitir que, em 1975 e em 1986, o PS teve um papel mais importante, quer na defesa da democracia, quer na entrada de Portugal na Europa, mas o PSD esteve ao seu lado.

Nem toda a história do PSD é linear, há momentos em que se caiu numa lógica de gestão de interesses no "bloco central", ou se permitiu uma viragem à direita, com Durão Barroso, e com Santana Lopes, roçando-se um populismo e um culto da personalidade, que abriu caminho a uma diluição programática. Por outro lado, a qualidade da governação, que tinha sido um ponto de honra na AD, perdeu-se com o acesso ao poder de muita gente impreparada ou ligada a interesses, que ajudou a retirar ao PSD o prestígio da boa governação. Na oposição, com excepção do momento de patologia de Menezes, quer Marques Mendes, quer Marcelo Rebelo de Sousa, quer Manuela Ferreira Leite tentaram introduzir alguma sanidade interna e algum rigor nas posições, mas todos falharam às mãos da degenerescência oligárquica no seio do aparelho partidário. Permitiu-se, como no PS, uma captura de um partido democrático por um aparelho de poder interno, muitas vezes medíocre, interesseiro e corrupto.

Assim se chegou aos dias de hoje. Em 2012, o PSD no Governo está a gerir apenas uma crise herdada, está a cumprir o seu programa, ou a permitir que se faça outra coisa de natureza muito distinta pouco coerente com o seu programa e a sua tradição? Temo que seja este último caso, e temo que se deixem isolados num vazio incómodo muitos dos militantes que ainda permanecem fiéis ao seu património fundador, que, esse sim, não é "actualizável", sob pena de perda da identidade do partido. Os mais veementes aplausos à acção governativa vêm de poderosos interesses na sociedade portuguesa, que pouco têm a ver com o eleitorado "genético" do PSD ou com os portugueses que é suposto representar pelo seu programa e acção.

A deslocação à direita foi tão violenta, sem rigor nem memória, que hoje um moderado do PSD que tente reformular no actual contexto algumas preocupações que fazem parte do gene do PSD parece um adversário do capitalismo e da liberdade económicos. Olhem que não, olhem que não. Falo, como é óbvio, do gene mesmo e não da sua reconstrução mutante feita para incorporar o memorando da troika como sendo a quinta-essência do programa do PSD.

A falta de equilíbrio do debate político, a sua ausência de memória histórica e ideológica e a sua subserviência às modas, o mimetismo da linguagem mediática e o simplismo redutor dos blogues chegaram a um ponto quase esquizofrénico de que falar com preocupação do desemprego, em vez das maravilhas do empreendedorismo, falar de equidade fiscal, falar de "justiça social", de preocupação com a pobreza, dos direitos dos trabalhadores, da "dignidade do trabalho", tudo isto pareça ser de um esquerdismo muito para lá do BE e do PCP. Mas, foi desta incomodidade face à injustiça, à desigualdade, à exclusão, ao desprezo pelos mais fracos, que os fundadores do PSD, a começar por Sá Carneiro, falaram. O resto vinha depois e era subordinado, instrumental, dependente deste sentido de fundo. Nenhuma deles veria sem repulsa a indiferença olímpica face ao empobrecimento colectivo e ao desemprego, seu principal factor. E nenhum deles tinha a mais pequena hesitação sobre o papel da economia privada, sobre o capitalismo, como instrumento de riqueza, mas a expressão "com sentido social" não era retórica, mas preocupação constante e primeira.

Há várias coisas que se estão a passar sob o manto da austeridade necessária que nada têm a ver nem com a austeridade, nem com a necessidade. Basta ler o que escrevi nos últimos anos para não ter dúvida nenhuma de que de há muito penso que um "ajustamento", como agora se diz, mesmo muito severo, seria inevitável e necessário. Nenhuma dúvida se me colocou de que esse "ajustamento" iria afectar muitos portugueses no seu nível de vida, e que não se podia escapar a esse destino, nem a bem, nem a mal. Foi a mal, com a troika a bater à porta. Mas depois deu-se uma sucessão de acontecimentos, que, esses sim, podiam ter ocorrido de outra maneira. Há várias coisas que estão a acontecer que deveriam merecer uma maior atenção de toda a gente sensata e moderada, a começar por aqueles que ainda chamam social-democrata ao seu partido.

O que está a mudar Portugal é que se está a dar uma enorme deslocação de recursos entre classes e grupos sociais, uns ganhando, outros perdendo. Não é um processo unívoco, mas a sua dimensão deveria preocupar um Governo do PSD. Mas não só não o preocupa como está activamente a contribuir para que isso aconteça. E, se é verdade que todos perdem - e os milhões que os nossos "milionários" perderam e estão a perder são reais e vultuosos -, nem por isso todos estão a perder da mesma maneira e alguns vão poder "sair" da crise com muito mais poder e mais bens, logo, a prazo, com mais dinheiro. Pelo contrário, a destruição da classe média vai deixar a sociedade sem mecanismos de mobilidade social e sem dinâmica.

A ideia de que pode haver uma "democratização da economia", signifique lá isso o que significar, não tem nenhuma correspondência com a realidade. A destruição maciça de empresas, a entrega de participações, bens, recursos à banca, quer directamente, quer por via intermediária do fisco, acompanha o desemprego como meio de embaratecer o trabalho. Em complemento deste processo, e com ele associada, há uma enorme redistribuição de poder, resultado de uma brutal e rápida concentração de poder de decisão e de recursos nas mãos de um grupo cada vez mais pequeno de pessoas, que circulam numa elite que sempre foi muito fechada, mas que agora ainda o é mais. As redes interiores do poder, que circulam entre os grupos económicos, o poder político, a grande advocacia de negócios, alguns think tanks, empresas de consultadoria, conselhos de administração das fundações mais poderosas, reguladores e, de um modo geral, todos os lugares de nomeação estatal, em "grupos de trabalho", "comissões de acompanhamento", etc. estão cada vez mais entregues "sempre aos mesmos". A razão é que as relações de confiança nestes momentos de crise são mais importantes do que tudo o resto, seja a competência e mérito, seja a renovação, sejam mesmo os valores propagados da competição e da liberdade económica. E os "mesmos" já deram provas de lealdade e serviço.

Os "mesmos" estão por isso também a escapar, quando não mesmo a beneficiar da crise. A demagogia reinante obriga toda a gente a dizer que trabalha de graça, mas aliás podiam até todos trabalhar de graça, porque o poder que assumem no exercício de certas funções acompanha-os para o lugar seguinte, que já é bem pouco gratuito. O mundo divide-se, pois, entre os que têm "acesso" e os que não têm, e a concentração do poder económico, o reforço do Estado fiscal, as ondas de eco de procedimentos autoritários e expeditos em nome da crise por todo o sistema bancário, o esbulho puro e simples ou a aceitação de propostas chantagistas para o acesso ao crédito estão a permitir centralizar o poder de decisão. O medo faz o resto.

Os aplausos não enganam. E os aplausos são cada vez mais agressivos, mais abafantes, menos tolerantes. É que oportunidades como esta de moldar o estado, a economia, os trabalhadores, as pessoas a uma mais drástica hierarquia de poder dos "mesmos", não acontecem todos os dias. O que está em jogo são poderosos interesses e encontraram ouvidos atentos e "espírito de serviço". Os "mesmos" desprezam os "políticos", mas não podem viver sem eles. Não ganham eleições, precisam dos "políticos". Para "encolher o país", como no filme."
José Pacheco Pereira
(Versão do Público de 17 de Março de 2012.)

segunda-feira, 12 de março de 2012

Concordo na íntegra

" Prefácio do Presidente da República no livro de intervenções “Roteiros VI”
9 de março de 2012
A magistratura ativa
Em 9 de março de 2011, iniciei o meu segundo mandato como Presidente da República, na sequência da vitória nas eleições presidenciais de 23 de janeiro, depois de uma campanha eleitoral bastante dura, sobre a qual este não é ainda o momento de escrever.
Pela quarta vez, numa disputa eleitoral em que pessoalmente me submetia ao julgamento dos meus concidadãos, obtive mais de 50% dos votos. Tratou-se de um gesto de confiança dos Portugueses que muito me honra. Senti, naturalmente, o peso desta responsabilidade histórica. A vitória nas eleições de 2011 teve um sabor especial, que reforçou em mim a admiração profunda e o sentimento de gratidão para com o povo português.
Durante a campanha, o calor humano que senti nas ruas fazia-me esperar a vitória, ciente do sentido de responsabilidade cívica que, nas alturas decisivas, os Portugueses sempre revelaram. Nos momentos de pausa, numa campanha em que percorri oitenta e um concelhos, esboçava aquilo que, caso ganhasse, iria ser o meu discurso de tomada de posse para um segundo mandato como Presidente da República. O discurso deveria corresponder aos compromissos assumidos perante os Portugueses: falar verdade, exercer uma magistratura ativa e apontar com clareza linhas de rumo e caminhos de futuro. Não poderia ser um discurso de ocasião. Teria de ser uma intervenção de fundo que levasse o Governo a reorientar o sentido da sua ação, adotando as políticas adequadas para ultrapassar a crise cujos efeitos dramáticos se tornavam visíveis de dia para dia.
Haveria que mostrar a todos, de uma forma objetiva, que o País se encontrava numa situação de emergência económica, financeira e social para deixar claro que era urgente mudar de rumo. Para chegar a essa conclusão, bastava recorrer aos indicadores oficiais, insuscetíveis de serem desmentidos, e que evidenciavam já, de forma inequívoca, a gravidade da situação que Portugal atravessava: o agravamento do desemprego, a estagnação económica, a insustentabilidade do défice das contas externas e do endividamento para com o estrangeiro, o nível preocupante da dívida do setor público administrativo e empresarial, a escassez de crédito disponível para as empresas, os riscos de pobreza e exclusão social em vastas camadas da população. Eram indicadores oficiais, objetivos, mas que muitos persistiam em ignorar ou dissimular.
Não tinha sido por falta de alertas, feitos em público e em privado, que o Governo não tinha ajustado as suas políticas, de modo a conter o agravamento da situação económica e social do País.
Eu próprio, tendo em vista a preparação da campanha eleitoral, fizera um levantamento dos muitos avisos que havia lançado em diversas intervenções públicas para os riscos que o País estava a correr, além das múltiplas chamadas de atenção que, em privado, transmitira ao Primeiro-Ministro nas audiências de quinta-feira.
Iniciei a campanha tendo feito esse trabalho e reunindo a máxima informação publicamente disponível sobre o estado do País, pois sempre foi meu propósito que a disputa eleitoral me desse a oportunidade de, num debate elevado e informado com os outros concorrentes, alertar os Portugueses para os perigos que corríamos.
No passado, fizera avisos particularmente fortes, chegando mesmo ao limite da terminologia que um Presidente da República pode utilizar no uso da palavra pública. Tal aconteceu, em especial, na Mensagem de Ano Novo de 1 de janeiro de 2010, em que afirmei que “com este aumento da dívida externa e do desemprego, a que se junta o desequilíbrio das contas públicas, podemos caminhar para uma situação explosiva”. A expressão “situação explosiva”, que na altura usei, seria mais tarde recordada por muitos; mas, em janeiro de 2010, foi ignorada pelos decisores políticos.
Pouco depois, em março desse mesmo ano, escrevi: “A gravidade da situação atual exige ação imediata. (…) Isso comporta, nomeadamente, apresentar um plano claro e credível da redução do défice e da dívida pública até 2013”.
Na sessão solene do 10 de junho de 2010, disse claramente aos Portugueses: “Como avisei na altura devida, chegámos a uma situação insustentável. Pela frente, temos grandes trabalhos, enormes tarefas, inevitáveis sacrifícios”.
Nunca escondi dos meus concidadãos que teríamos de nos preparar para um tempo de exigências e sacrifícios. Mas, surpreendentemente, foram vários os agentes políticos, analistas e comentadores que me criticaram pelo dramatismo daquelas afirmações, quando já era evidente que a situação económica portuguesa era insustentável a curto prazo, como, aliás, vinha a ser também referido por entidades internacionais independentes. Perante as críticas de que fui alvo, interroguei-me: como é possível este grau de desconhecimento ou distração? Será pura ignorância da realidade ou, o que é mais grave, desejo de escondê-la dos Portugueses?
Ainda hoje, alguns insistem em afirmar que o Presidente da República não alertou o País, em devido tempo, para a gravidade da situação que vivíamos. A esta acusação, pretendeu-se juntar uma outra, a de que pactuava com uma política de ocultação da verdade, pois era movido por razões de calculismo eleitoralista com vista ao sufrágio de janeiro de 2011. A abundante informação que todos podem encontrar nos volumes dos Roteiros que anualmente publiquei, a par de todas as intervenções que estão devidamente registadas na página oficial da Presidência da República na Internet, desmentem de forma categórica os que formulam acusações que, pela sua ignorância ou má-fé, me abstenho de comentar.
Os alertas que atrás transcrevi, a título meramente exemplificativo, porque muitos mais podia apresentar, são a melhor prova de que falei verdade ao País – e falei verdade na altura certa, quando havia ainda tempo para corrigir políticas e para mudar de rumo. Porque penso na situação que agora vivem milhares de Portugueses, não me congratulo pelo facto de a História me ter dado razão. Lamento, isso sim, que perante uma evidência tão objetiva e tão clara, interesses de ocasião, aliados a uma forma obstinada de ação política, tenham contribuído para que a palavra serena, firme e imparcial do Presidente da República haja sido menosprezada, quando deveria ter merecido uma reflexão séria por parte dos responsáveis políticos. Ao invés, preferiu desviar-se as atenções dos Portugueses para polémicas e controvérsias, abrindo “questões fraturantes” que tinham como propósito marcar a agenda política e mediática e, assim, iludir os cidadãos sobre as opções essenciais que o País devia ter tomado no tempo certo.
Não me deixei enredar nessa estratégia, mesmo sabendo que daí poderiam decorrer custos políticos, que assumi frontalmente em nome da ética da responsabilidade. Os que me acusam de calculismo e de eleitoralismo devem hoje, graças ao distanciamento temporal que já existe, fazer uma avaliação serena da minha atitude e reconhecer os erros cometidos.
Foi a constatação de que os meus alertas, assim como os de vários economistas prestigiados e independentes, não eram devidamente escutados, num cenário de progressiva degradação da situação económica e social, que me levaram a propor aos Portugueses uma magistratura presidencial ativa. Fi-lo em plena campanha eleitoral, pelo que o julgamento dos cidadãos foi também um sinal de adesão ao compromisso político que assumi perante os eleitores. E, ao contrário do que alguns sustentaram, a noção de magistratura ativa não colide nem infirma o princípio da cooperação estratégica. Este último, como eu próprio escrevi em 2006, traduz o empenho do Presidente da República na concretização de grandes objetivos nacionais, dotados de um amplo consenso. Nenhum Presidente da República pode abdicar da cooperação estratégica com os demais órgãos de soberania. A magistratura ativa, por seu turno, corresponde a uma intervenção do Presidente que se intensifica em função das necessidades do país, nomeadamente nos momentos de emergência social e económica.
Foi neste contexto que, em novembro de 2010, ao elaborar o meu manifesto eleitoral, deixei afirmado de forma transparente que, se acaso os meus alertas tivessem sido devidamente escutados, a correção da linha de rumo poder-se-ia ter feito atempada e faseadamente, poupando as famílias, sobretudo as de menores recursos, aos enormes sacrifícios que agora têm de enfrentar de uma forma abrupta.
Em 10 de janeiro de 2011, quando decorria em pleno a campanha eleitoral, também o Governador do Banco de Portugal alertou para a situação que vivíamos, dizendo serem “insustentáveis tanto a trajetória da dívida pública como as trajetórias da dívida externa e da posição de investimento internacional do nosso País”. Levei muito a sério estas declarações. O facto de uma afirmação desta gravidade, produzida por uma entidade independente e dotada de informação privilegiada, como o Governador do Banco de Portugal, não ter provocado um sobressalto na sociedade portuguesa constituiu para mim a prova definitiva de que a classe política – pelo menos, uma parte significativa dela – não estava plenamente consciente da gravidade da situação. Ou, o que era pior, ignorava-a de forma deliberada.
Fiquei, então, firmemente convicto de que não podia deixar de sublinhar de novo a urgência de mudar de rumo na cerimónia da tomada de posse. Por outro lado, com base na minha experiência e nos meus conhecimentos, a que se aliava o contacto com a realidade e com interlocutores na esfera económica, laboral e social, senti o imperativo patriótico de apontar os caminhos que, em meu entender, deveriam ser seguidos.
Contribuir ativamente para uma nova linha de orientação estratégica para a economia nacional tornou-se para mim, ainda antes do final da campanha, um imperativo de consciência. Se me candidatava para servir os Portugueses, não poderia agir de outro modo. Caso contrário, de nada valeria a pena ter-me submetido de novo ao juízo dos eleitores e a uma campanha eleitoral particularmente dura, em que alguns não hesitaram sequer em pôr em causa o valor que mais prezo: a minha honorabilidade pessoal.
Os titulares de cargos públicos têm um dever de verdade e um imperativo de lealdade para com os seus concidadãos. Naquela ocasião, era imperioso que a palavra do Presidente despertasse consciências e convocasse a atenção dos agentes políticos para a urgência em ajustar as políticas económicas, sob pena de nos aproximarmos de uma situação explosiva. Eu tinha afirmado várias vezes que, na ausência de correção dos desequilíbrios da economia portuguesa, haverá sempre um momento em que alguém tem de pagar a fatura e a experiência ensinava que a fatura seria paga, acima de tudo, pela classe média e pelos mais desfavorecidos.
Apontar caminhos de futuro, linhas de orientação estratégica, grandes objetivos e desígnios nacionais, deixar alertas e avisos, contribuir para o diagnóstico correto das dificuldades e oportunidades, chamando a atenção para problemas que urge enfrentar, constitui uma prática que se enquadra no espaço autónomo de intervenção política do Presidente da República, tal como foi sedimentado ao longo dos anteriores mandatos presidenciais. Esta é uma função que adquire especial relevância em momentos graves da vida nacional.
Por vezes, há quem acuse o Presidente da República de não especificar as medidas que entende que devem ser tomadas para alcançar os objetivos. Em princípio, não o deve fazer em público, mesmo que delas tenha conhecimento e sobre elas tenha uma opinião formada, podendo fazê-lo, em privado, nos encontros regulares que mantém com o Primeiro-Ministro. A definição e a execução das medidas concretas que dão conteúdo às estratégias e linhas de orientação competem ao Governo, enquanto órgão constitucionalmente responsável pela política geral do País.
Quando, na sequência do pedido de ajuda externa, formulado pelo Governo em abril de 2011, os técnicos da chamada “troika” procederam ao diagnóstico da situação económica e financeira nacional, os problemas da economia portuguesa identificados coincidiram, no essencial, com aqueles para que, em devido tempo, tinha alertado.
Como é do conhecimento público, foi só em 6 de abril de 2011 que o Governo anunciou a decisão de recorrer à ajuda externa, poucas horas depois da publicação de uma entrevista concedida pelo então Ministro das Finanças a um jornal económico em que afirmou, a dado passo, que era “necessário recorrer aos mecanismos de financiamento disponíveis no quadro europeu”.
Imediatamente após o anúncio da decisão do Governo, e em articulação com o Primeiro-Ministro, iniciei os contactos com os líderes dos partidos da oposição. Referi-lhes a gravidade da situação financeira em que Portugal se encontrava e procurei sensibilizá-los para uma atitude de cooperação responsável com o Governo e para a importância de uma posição consensual, tão ampla quanto possível, nas negociações com as instituições internacionais que iriam seguir-se.
Há cerca de duas semanas que se avolumavam sinais muitíssimo preocupantes, multiplicando-se os indicadores sobre a impossibilidade de Portugal obter os meios necessários para assegurar o financiamento da economia e do Estado. Haveria que atuar com prudência e reserva, dado que uma intervenção do Presidente naquele contexto iria contribuir negativamente para um aumento da instabilidade e da falta de confiança externa. O Governo – a única entidade detentora de toda a informação sobre os meios financeiros detidos ou suscetíveis de ser obtidos pelo Tesouro – tinha colocado como ponto de honra não solicitar a ajuda do Fundo Monetário Internacional – e afirmou-o publicamente, o que adensava os problemas de gestão da crise.
Pela minha parte, tivera o cuidado de, na comunicação ao País que fiz em 31 de março de 2011, sobre a dissolução da Assembleia da República, garantir publicamente que o Governo contaria com todo o meu apoio para que não deixassem de ser adotadas as medidas indispensáveis a salvaguardar o superior interesse nacional e assegurar os meios de financiamento necessários à nossa economia. Confirmava, assim, publicamente, o que em privado transmitira ao Primeiro-Ministro. Se o Governo decidisse solicitar a ajuda externa, teria todo o apoio do Presidente da República.
O facto de, após a demissão do Primeiro-Ministro, se ter começado a viver um ambiente de pré-campanha eleitoral, certamente contribuiu para o atraso no pedido de auxílio financeiro. Esta questão convertera-se num tema de controvérsia político-partidária, quando, pela sua gravidade, deveria ser tratada numa perspetiva de salvaguarda do interesse nacional, que não conhece partidos nem fações.

A crise política de 2011
Dois dias depois da minha tomada de posse como Presidente da República, para o exercício de um segundo mandato, acelerou-se o desenvolvimento de uma crise política cujos sinais já se vinham avolumando no horizonte.
A 11 de março de 2011, o Governo divulgou ao País um amplo conjunto de medidas de austeridade e de reformas estruturais que tinham acabado de ser apresentadas às instâncias comunitárias, o chamado “PEC IV”, visando reduzir o défice das contas públicas e o reforço da competitividade da economia portuguesa. O anúncio inesperado deste programa suscitou de imediato uma reação negativa de todos os partidos da oposição, que criticaram quer o seu conteúdo, quer a forma como o mesmo fora apresentado à União Europeia, sem previamente ser comunicado às diversas forças políticas. Por imperativos de defesa do interesse nacional, sempre fora prática na vida política portuguesa os governos informarem antecipadamente as outras forças partidárias das posições que iriam tomar em Bruxelas.
Não dispondo o Governo de apoio maioritário na Assembleia da República, rapidamente se disseminou o sentimento de que aquele programa seria rejeitado se fosse submetido a votação no Parlamento. Em menos de 24 horas, todos os partidos da oposição manifestaram-se pública e inequivocamente no sentido da rejeição do “PEC IV”. Percebi claramente que o risco de eclosão de uma crise política, já latente há alguns meses, se agravara de forma súbita.
Desde que iniciara funções, o Governo revelava grande dificuldade em adaptar-se à situação decorrente da perda de maioria absoluta nas eleições legislativas de setembro de 2009. Era sempre com grande contrariedade, e só depois de muito pressionado, que aceitava dialogar com os partidos da oposição para aprovar leis na Assembleia da República e para obter consensos imprescindíveis no tratamento de matérias de interesse nacional. Ao mesmo tempo, recorria frequentemente a uma linguagem de inusitada contundência no tratamento dos seus adversários, a que estes respondiam em tom muito duro, adensando um clima de conflitualidade e de crispação de que os Portugueses se iam apercebendo com preocupação.
Ao longo do tempo, fui detetando, nos contactos regulares que mantive com os líderes partidários, um aumento da falta de confiança recíproca entre o Governo e a oposição. Existia, desde logo, uma crescente dificuldade em alcançarem entendimentos em torno de medidas essenciais – e urgentes – para enfrentar os problemas económicos e sociais do País.
O modo como foi apresentado publicamente o novo Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC IV) tornou-se o sinal mais evidente daquela falta de confiança. O Governo decidira avançar isoladamente, sem a precaução de, em devido tempo, desenvolver esforços para criar condições de diálogo com as forças da oposição que permitissem obter um consenso capaz de garantir o indispensável apoio político à aprovação de novas e mais exigentes medidas de consolidação orçamental.
O anúncio do “PEC IV” apanhou-me de surpresa. O Primeiro-Ministro não me deu conhecimento prévio do programa, nem me tinha dado conta das medidas de austeridade orçamental que o Governo estava a preparar e da sua imprescindibilidade para atingir as metas do défice público previstas para 2011, 2012 e 2013. Pelo contrário, a informação que me era fornecida referia uma situação muito positiva relativamente à execução orçamental nos primeiros meses do ano. O Primeiro-Ministro não informou previamente o Presidente da República da apresentação do Programa de Estabilidade e Crescimento às instituições comunitárias. Tratou-se de uma falta de lealdade institucional que ficará registada na história da nossa democracia. O Presidente da República, nos termos constitucionais, deve ser informado acerca de assuntos respeitantes à condução da política interna e externa do País.
Esta atitude contrastou de forma flagrante com aquela que o Governo tinha adotado meses antes, no processo de aprovação do Orçamento para 2011. Logo a seguir às férias do verão, o Primeiro-Ministro começou a informar-me, com algum detalhe, sobre as intenções do Governo e sobre as dificuldades que poderiam surgir nas negociações com os partidos da oposição, em particular com o PSD. Foi-me assim possível, durante cerca de dois meses, acompanhar de perto as questões políticas e financeiras relacionadas com a aprovação do Orçamento, desenvolver contactos com dirigentes partidários, apoiar as negociações e favorecer os entendimentos. Em suma, conseguiu evitar-se a ocorrência de uma crise política que, a precipitar-se naquela altura, seria particularmente grave, uma vez que, nos termos da Constituição, me encontrava impedido de dissolver a Assembleia da República e convocar novas eleições. Se acaso tivesse ocorrido uma crise nesse momento, a sua resolução e a clarificação da situação política só poderiam verificar-se passados vários meses, com indiscutível prejuízo para o interesse nacional.
Foram vários os agentes políticos que, simulando não ver que o comportamento do Governo em relação ao Presidente da República, no caso do Orçamento para 2011 e no caso do “PEC IV”, eram diametralmente diferentes, assim como eram bem distintas as posições dos partidos da oposição, me acusaram de não ter atuado por forma a evitar a crise política, como fizera no primeiro caso.
No processo de aprovação do Orçamento para 2011, estando devidamente informado das questões em aberto e dos pontos sob controvérsia, pude atuar de modo a estimular as negociações em curso, respeitando o quadro de competências que a Constituição me atribui. Nesse sentido, convoquei o Conselho de Estado para o dia 29 de outubro de 2010, tendo, no final dessa reunião, feito uma comunicação ao País em que realcei que os conselheiros de Estado «se pronunciaram no sentido de o Governo e os partidos representados na Assembleia da República realizarem um esforço adicional para chegar a um compromisso tão rapidamente quanto possível» para a aprovação do Orçamento.
Não restava a mínima dúvida para qualquer observador atento que a situação criada em 11 março de 2011 tinha contornos completamente distintos. Não tendo sido informado previamente sobre o conteúdo ou sequer a existência do “PEC IV”, o Presidente foi impedido de exercer a sua magistratura de influência com vista a evitar o deflagrar de uma crise política. Em pouquíssimos dias, a crise acabaria por se precipitar a uma velocidade vertiginosa, tendo um desfecho previsível. Em face da rejeição do “PEC IV” pela Assembleia da República, o Primeiro-Ministro apresentou-me a sua demissão, no dia 23 de março, por considerar que não dispunha de condições políticas para se manter em funções.
Sem perder tempo, convoquei os partidos políticos com representação parlamentar, que recebi em audiência dois dias depois da demissão do Primeiro-Ministro. Todos os partidos expressaram a opinião de que, naquele quadro parlamentar, não era possível gerar outra solução governativa com condições para enfrentar os problemas do País e defenderam a dissolução da Assembleia da República e a realização de eleições legislativas.
Depois de ouvir os dirigentes partidários, reforcei a minha convicção pessoal de que não existia qualquer hipótese de constituir um governo alternativo com um mínimo de solidez e consistência, dado o grau de desconfiança recíproca que se formara entre o Governo demissionário e todos os partidos da oposição. Estes últimos, aliás, excluíram liminarmente a possibilidade de participarem num Governo com o Partido Socialista liderado pelo então Primeiro-Ministro.
Insistir na tentativa de encontrar uma solução governativa sem convocar eleições teria sido uma inútil perda de tempo, que prejudicaria o País em face do crescente agravamento da situação financeira. Impunha-se ultrapassar com rapidez o impasse político criado pelo pedido de demissão do Primeiro-Ministro, restituindo a palavra ao povo.
Decidi, assim, atuar com determinação e celeridade, desencadeando o processo de dissolução da Assembleia da República, ouvindo o Conselho de Estado – que, por unanimidade, se pronunciou favoravelmente à dissolução parlamentar e à realização de eleições – e, no final, convocando os Portugueses para um novo sufrágio.
A posição dos partidos da oposição em nada me surpreendeu. Tinha muito presente as posições inequívocas que já me tinham transmitido em outubro de 2009, na sequência das eleições legislativas. Nessa altura, todos afastaram a ideia de participar num governo de coligação com o Partido Socialista. De igual modo, tinha em mente as posições manifestadas pelos partidos em setembro de 2010, quando os ouvi no âmbito do processo de aprovação do Orçamento, em que repetiram o que haviam afirmado em outubro de 2009. Agora, em março de 2011, reiteravam, pela terceira vez, a posição que sempre manifestaram desde as eleições.
Quando ouvi os partidos da oposição, em outubro de 2009, com vista à designação do Primeiro-Ministro do novo Governo, detetei neles fortes marcas de ressentimento e de desconfiança em relação ao Partido Socialista e, sobretudo, ao seu líder, deixadas pela experiência de governo de maioria absoluta na legislatura anterior.
Por seu turno, o Partido Socialista também não manifestou interesse genuíno na formação de um Governo de coligação, preferindo uma solução governativa monopartidária, ainda que minoritária. Da proposta então feita pelo Partido Socialista a todos os partidos para integrarem um governo de coligação nunca poderia resultar uma solução política com solidez e consistência.
Há quem tenha a ilusão de que o Presidente da República pode impor aos partidos, contra a vontade destes, a sua participação em governos de coligação, por vezes apelidados de «salvação nacional».
O Presidente da República pode exercer a sua magistratura de influência para que sejam encontradas soluções governativas estáveis e coerentes, dentro dos limites que decorrem do estrito imperativo de imparcialidade no tratamento das diversas forças partidárias, compromisso que assumi perante os eleitores e do qual não me afastarei um milímetro. No entanto, mesmo admitindo que o Presidente, através de uma forte pressão, consiga alterar a posição e a estratégia de um partido, levando-o a aceitar, a contragosto, coligar-se com outro para formar governo, entendo que não o deve fazer. A solução de governo que daí resultaria, não correspondendo a uma autêntica vontade de coligação estável e duradoura, seria sempre artificial e precária, consumindo-se rapidamente em lutas internas e dando lugar a uma instabilidade política muito prejudicial ao País.
Se um partido manifesta a posição firme de não querer coligar-se com outro, designadamente por este não lhe merecer confiança ou por com ele manter profundas divergências quanto ao rumo da governação, não poderão o empenhamento e a influência do Presidente, por maiores que sejam, criar condições de solidez e durabilidade governativa onde à partida não existem, como, aliás, a história da nossa democracia o demonstra à saciedade. Não tenho dúvidas de que seria isso que teria acontecido se, em outubro de 2009, tivesse forçado, para além do razoável, a constituição de um governo de coligação, contra a vontade inequívoca manifestada em privado e em público pelos partidos.
Considerei, por isso, na linha das opiniões que reuni junto das diversas forças partidárias, que a solução mais adequada ao interesse nacional consistia em, por um lado, respeitar os resultados do sufrágio e, por outro, conferir posse ao Governo do partido vencedor das eleições, com o qual nenhum outro quis coligar-se. Mas nem por isso deixei de ter presentes as especiais responsabilidades de diálogo que recaem sobre um Governo minoritário, como, de resto, deixei claramente afirmado no discurso que proferi na tomada de posse do XVIII Governo Constitucional, em 26 de outubro de 2009. Na ocasião, disse que, naquele contexto, «o diálogo e a concertação na procura dos consensos possíveis ganham uma relevância acrescida». E acrescentei, de forma clara: «É necessário encontrar compromissos com as outras forças políticas, ouvir os agentes sociais e as organizações da sociedade civil, estar particularmente atento aos problemas reais que as famílias enfrentam no seu dia-a-dia».
Na verdade, as dificuldades de um Governo de maioria relativa tendem a ser substancialmente potenciadas quando antes o governo dispunha de maioria absoluta e a perdeu por vontade do povo manifestada em eleições. Na altura, tive ocasião de lembrar essa realidade, que inquestionavelmente exigia do Governo minoritário uma atitude de humildade democrática e empenho num diálogo frutuoso, construtivo e sério com as demais forças políticas. A ausência desse diálogo, que ficou patente na falta de informação sobre o “PEC IV”, acabaria por ditar o destino do Governo minoritário do Partido Socialista.
Aquando das eleições legislativas de 5 de junho de 2011, conhecedor dos antagonismos existentes entre as forças partidárias, dirigi-lhes um forte apelo para que a campanha decorresse com elevação nas palavras e nas atitudes e se evitassem crispações que inviabilizassem, após as eleições, o diálogo e os compromissos de governabilidade de que o País tanto necessitava.
Na intervenção que proferi na cerimónia comemorativa do 25 de abril, no Palácio de Belém, afirmei que o Governo saído das eleições devia dispor de apoio maioritário na Assembleia da República. Era um sinal dirigido aos partidos políticos que se baseava na minha visão das exigências do País naquela conjuntura. O resultado eleitoral acabou por facilitar a formação de um Governo de coligação com maioria parlamentar.
Durante o período de Governo minoritário, constatei que existiam - e continuam ainda a existir – na sociedade portuguesa algum desconhecimento e diversos equívocos sobre o relacionamento entre o Presidente da República e o Governo e quanto aos poderes presidenciais no contexto do nosso sistema semipresidencial.
São muitos aqueles que julgam, erroneamente, que o Presidente da República dispõe, nos termos da Constituição, do poder de demitir o Primeiro-Ministro e de o substituir por um outro.
Importa esclarecer que, de acordo com o artigo 195º da Constituição, o Presidente da República só pode demitir o Governo – e não o Primeiro-Ministro – quando tal se torne necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas. Após a revisão constitucional de 1982, o Governo deixou de ser politicamente responsável perante o Presidente da República e, como assinalam diversos constitucionalistas, aquele é um pressuposto que sempre suscita grandes dificuldades de concretização. Por outras palavras, a falta de confiança política no Governo não é um motivo constitucionalmente válido para o demitir. Se, porventura, o Presidente da República considerar que se impõe uma clarificação da situação política, deve, isso sim, dissolver a Assembleia da República e convocar eleições, faculdade que o Presidente está inibido de exercer nos últimos seis meses do seu mandato, o que ocorreu, sensivelmente, entre o início de setembro de 2010 e o início de março de 2011.
Estando o Presidente da República impedido de demitir o Governo por falta de confiança política, aí residirá, muito provavelmente, a razão pela qual, após a revisão constitucional de 1982, nunca um Presidente tenha demitido o Executivo para assegurar o regular funcionamento das instituições democráticas. Já várias vezes vi escrito que o meu antecessor, o Dr. Jorge Sampaio, demitiu o Primeiro-Ministro, Dr. Pedro Santana Lopes, em novembro de 2004. Trata-se de uma afirmação que não corresponde à verdade. O então Presidente da República dissolveu, isso sim, a Assembleia e o Primeiro-Ministro apresentou a sua demissão.
Neste quadro constitucional, em que o Presidente da República não pode livremente demitir o Governo, o que se tem verificado, na prática, é os Presidentes da República dissolverem o Parlamento quando entendem que o Governo já não reúne condições para se manter em funções.
Os Portugueses sabem que sou um defensor da estabilidade política, ainda que não a qualquer preço. Mas, como já declarei várias vezes, considero que, gozando o Governo da confiança da Assembleia da República, perante a qual responde politicamente, só em circunstâncias excecionais deve o Presidente proceder à dissolução do Parlamento. Se esta leitura da Constituição é válida em tempos de normalidade, ela ganha relevância acrescida sempre que o País se vê confrontado com uma situação financeira, económica e social que, pela sua inusitada gravidade, reclama ponderação, equilíbrio e sentido de Estado por parte de todos os agentes políticos.
Desde que assumi funções como Presidente da República foram rejeitadas todas as moções de censura ao Governo votadas na Assembleia, incluindo na fase em que o Executivo dispunha apenas de maioria relativa. Os partidos da oposição, embora manifestassem sérias reservas quanto à confiança política que o Governo do Partido Socialista lhes inspirava, não só não rejeitaram o Programa de Governo que este apresentou, na sequência das eleições de 2009, como, em nenhuma ocasião, aprovaram na Assembleia da República uma moção de censura ao Executivo.
Na profunda reflexão que fiz, e que não deixou de atender à circunstância de me encontrar constitucionalmente impedido de dissolver a Assembleia nos últimos seis meses do meu mandato, concluí que não se verificava o pressuposto constitucionalmente necessário para demitir o Governo, já que o regular funcionamento das instituições não se encontrava em causa. Não existiam, pois, motivos para utilizar uma faculdade presidencial a que, desde 1982, nenhum dos meus antecessores recorreu.
Neste quadro político, só dissolvi a Assembleia da República quando, após o pedido de demissão do Primeiro-Ministro, em março de 2011, obtive a certeza de que não havia solução alternativa de governo na atual composição do Parlamento. Ficou claro que me guiava exclusivamente por aquilo que, em consciência, considerava ser o superior interesse nacional, respeitando o equilíbrio de poderes previsto na Constituição e não permitindo qualquer partidarização ou instrumentalização do Presidente da República.
Foram também muitas as vozes, algumas das quais esclarecidas e de boa-fé, que pediram que o Presidente da República se substituísse ao Governo, exercendo funções executivas, o que representaria uma violação grosseira do princípio da separação de poderes inscrito na Lei Fundamental. Ainda hoje, subsiste em alguns a ideia de que o Presidente da República deve intervir na ação governativa para resolver diretamente os problemas nacionais, os dos grupos a que pertencem ou até mesmo os seus problemas pessoais. Esquecem-se de que, nos termos da Constituição, o Governo é o órgão responsável pela condução da política geral do País.
Como escreveu o Presidente da República que me antecedeu no cargo, o Presidente não governa e não é responsável ou sequer corresponsável pela política prosseguida pelo Governo. De facto, o Presidente não pode, nem deve, substituir-se ao Governo nem à oposição, a quem cabe encontrar as alternativas políticas à solução governativa existente.
O Presidente da República detém, todavia, um importante conjunto de poderes efetivos, ainda que não diretamente executivos, como o poder de veto, o poder de dissolução da Assembleia da República, o poder de demissão do Governo, nas circunstâncias estritas atrás enunciadas, ou o de nomeação do Governo e de altas figuras do Estado, a que se junta a magistratura de influência, que resulta da legitimidade que advém da sua eleição por sufrágio direto e universal.
Para o exercício dos seus poderes, o Presidente da República tem o direito de ser informado pelo Governo sobre a condução da política geral do País, seja no plano interno, seja no plano externo. Justamente por isso, desde há várias décadas foi instituída a prática de uma audiência semanal de trabalho com o Primeiro-Ministro, o que não se verifica com os máximos representantes dos demais órgãos de soberania. Existe, além disso, um contacto permanente com o Governo, seja no domínio do processo legislativo, seja nos variados domínios da ação governativa.
É certo que à Presidência da República aflui muita outra informação que não a veiculada pelo Governo. Desde o início do meu mandato, tenho procurado manter-me informado através de contactos frequentes com agentes políticos, económicos e sociais e, por outro lado, possuir uma relação de proximidade com o poder autárquico, a sociedade civil e as populações através das minhas deslocações pelo País. Recebo, com regularidade, personalidades estrangeiras, representantes diplomáticos, representantes empresariais e sindicais, personalidades eminentes da vida pública portuguesa, da economia à cultura, passando pelas mais variadas instituições e associações. De todos recebo um conjunto muito rico e diversificado de informação, nem sempre coincidente com aquela que me é transmitida pelo Governo.
Estabeleci, no entanto, uma regra que julgo ser elementar no contexto de uma democracia adulta e consolidada, em que os titulares de cargos públicos desempenham as suas funções com sentido de responsabilidade e de Estado. Dou prevalência à informação do Governo; caso contrário, teria de admitir que este a deturpava. Creio que se trata de um princípio fundamental que decorre da confiança e da lealdade que deve existir entre os diversos órgãos de soberania.
Tendo de acompanhar as questões mais variadas da vida nacional, cumpre ao Presidente da República identificar a informação relevante para a sua avaliação e formação do seu juízo e, em caso de necessidade, tomar posição.

Uma estatística esclarecedora
Durante o meu primeiro mandato recebi do Governo, para efeitos de promulgação, 1741 diplomas, dos quais 696, ou seja 40%, deram lugar a contactos entre a Presidência da República e o Governo, tendo em vista o esclarecimento do seu conteúdo. Daí resultaram alterações em 381, ou seja, em 22% do total dos diplomas submetidos a promulgação.
Esta estatística ilustra bem a intensidade das relações entre a Presidência da República e o Governo no processo legislativo, a que acresce a análise de diplomas específicos feita nas minhas reuniões com o Primeiro-Ministro. Trata-se de uma importante dimensão da magistratura de influência do Presidente da República, tanto mais eficaz quanto exercida discretamente, fora do alcance dos holofotes da comunicação social.
Os contactos regulares com o Governo no sentido de obter esclarecimentos sobre os diplomas submetidos a promulgação e de introduzir-lhes aperfeiçoamentos, quer de caráter formal, quer de âmbito mais substancial, é uma prática que tem sido seguida por todos os Presidentes da República desde 1976.
Trata-se de uma prática que decorre do poder de veto que a Constituição concede ao Presidente da República, o qual, relativamente a diplomas do Governo, é absoluto, uma vez que é insuscetível de confirmação pelo executivo.
Entendo que, nestas circunstâncias, o Presidente da República possui o direito de, para formar a sua decisão, solicitar a informação que considere adequada. De igual modo, tem sido minha posição não recusar os ajustamentos que o Governo, face a dúvidas ou objeções por mim suscitadas, entenda introduzir nos diplomas. Isto não significa, naturalmente, que o Presidente da República atue como co-legislador nem, tão-pouco, pode prejudicar a decisão final sobre o destino de cada diploma. Como afirmei em várias ocasiões, a promulgação de um diploma não traduz a adesão do Presidente da República a todas as normas e soluções nele contidas. Todavia, tal como sustentam os constitucionalistas Gomes Canotilho e Vital Moreira, “nada impede que o Presidente da República, em vez de vetar formalmente à partida os diplomas, prefira sugerir primeiro ao Governo as alterações necessárias à superação das objeções presidenciais”.
Assim, ao longo do meu primeiro mandato, sempre segui esta prática, no quadro de uma interpretação alargada de cooperação institucional com o Governo. Por esta razão, e ao contrário do que havia ocorrido em outros mandatos presidenciais, não requeri a fiscalização preventiva da constitucionalidade, tendo apenas exercido o direito de veto relativamente a um diploma do Governo.
A prática seguida nas relações entre o Presidente da República e a Assembleia da República em matéria legislativa é muito diferente da seguida nas relações com o Governo.
Existe uma total separação entre os procedimentos de aprovação dos diplomas por parte da Assembleia da República e de promulgação pelo Presidente da República. Os diplomas aprovados pela Assembleia da República chegam à Presidência da República em versão definitiva, sem que sobre eles tenham ocorrido contactos prévios entre os dois órgãos de soberania, sem prejuízo do acompanhamento do procedimento legislativo que é feito pelo meu assessor para os assuntos parlamentares.
Uma vez entrados na Presidência da República, os decretos da Assembleia da República só têm três caminhos possíveis: serem promulgados, vetados politicamente ou submetidos à apreciação do Tribunal Constitucional.
A prática seguida tem sido, contrariamente ao que sucede quanto aos diplomas aprovados pelo Governo, a da inexistência de contactos formais com a Assembleia da República visando a obtenção de esclarecimentos relativamente aos diplomas ou a introdução de aperfeiçoamentos.
A justificação para a existência de práticas distintas consoante se trate de diplomas do Governo ou da Assembleia da República assenta, por um lado, na especificidade e natureza pública do processo parlamentar de aprovação dos decretos e, por outro, no facto de, quer o veto político, quer mesmo o veto por inconstitucionalidade do Presidente da República relativamente aos decretos da Assembleia da República, não terem caráter absoluto, podendo, pois, nos termos da Constituição, ser objeto de uma votação de confirmação que ultrapasse aqueles vetos.
Dos diplomas da Assembleia da República submetidos a promulgação durante o meu primeiro mandato, 398 foram promulgados, 14 foram objeto de veto político e 6 vetados por inconstitucionalidade, na sequência de uma pronúncia nesse sentido pelo Tribunal Constitucional.
O número de diplomas da Assembleia da República e do Governo submetidos a promulgação, alguns de grande complexidade, a que se juntam os decretos presidenciais (787 durante o meu primeiro mandato) dão uma ideia do espaço que a sua análise ocupa na agenda do Presidente da República.

Com os Portugueses
No meu segundo mandato como Presidente da República, serei fiel aos compromissos que assumi perante os Portugueses: cumprir e fazer cumprir a Constituição, manter uma rigorosa independência no tratamento das diversas forças políticas e desenvolver uma magistratura ativa perante os desafios que Portugal atravessa no atual momento histórico.
Acima de tudo, assumi um compromisso de proximidade com todos os cidadãos. Sou Presidente de Portugal inteiro, de todos os Portugueses, sem exceção. Tenho consciência da responsabilidade singular que decorre do exercício das funções de Presidente da República. Conheço o País, conheço Portugal e os Portugueses. Sei as dificuldades que atravessamos, mas tenho também presente as enormes potencialidades de que Portugal dispõe. O nosso maior potencial é humano. O nosso maior potencial são os Portugueses, especialmente os jovens – os jovens que não se conformam, que aspiram a um futuro melhor. Essa é a nossa maior razão de esperança, o grande desígnio coletivo que nos deve unir. Em nome de um Portugal melhor, mais desenvolvido e mais justo, não me resigno nem me conformo. Ao longo deste segundo mandato, iniciado há precisamente um ano, irei ser o Presidente do inconformismo e da esperança. Os Portugueses podem contar comigo."

Aníbal Cavaco Silva
Março 2012

quinta-feira, 8 de março de 2012

Marketing político no Brasil - 2004


ou ainda...

"aos olhos, perfeito"

No seguimento do post anterior...

"Aos olhos, perfeito"

Herança socrática, mais uma

Sou consultor de empresas e, como muitos colegas, tenho clientes em Lisboa, Porto, Aveiro, Braga... e também tenho a sorte de ter clientes em locais tão distantes e interessantes como a Régua, Portalegre, Felgueiras, Ponte de Sôr, etc..
Sorte porque é um prazer percorrer quilómetros pelo país, vendo paisagens tão díspares e tão belas, contactar com pessoas tão diferentes que me fazem ter orgulho de ser português.
Ao percorrer o país de uma ponta a outra, pelo litoral ou pelo interior, tenho percepção das capacidades turísticas que podemos oferecer devido a aldeias cristalizadas no interior alentejano, o Douro património mundial, as Portas de Ródão que abrem Portugal ao Tejo, a gastronomia, diversidade e, sobretudo, gente simpática!
Ao percorrer o país de uma ponta a outra, por autoestradas quase desertas, o que se vê no topo dos montes? Ventoinhas!
De Viseu a Vila Real, cruzando o Douro, não deve haver um único espaço sem ventoinhas. De Pombal a Castelo Branco, idem. No Marão, a mesma coisa. Quando se está no topo de Revinhade e se olha em volta para a Cabreira e para o Gerês, a mesma coisa. Na Freita, a fronteira do litoral com o interior em Aveiro, igual. Sair de Lisboa para a Região do Oeste e a companhia mantem-se.
Não sou ambientalista e considero que se devem aproveitar os recursos naturais a bem da economia do país.
No entanto, quando vejo a revista da RyanAir com uma artigo que diz que "namorar em Portugal é em Vila Verde", uma excelente promoção ao interior transmontano feita pelo Turismo do Porto e Norte, penso naquilo que os turistas vão ver até chegarem ao destino: ventoinhas.
O que seria mais lucrativo para o país? Energia eólica ou paisagens únicas em todo o mundo, com a menor intervenção do Homem, em que é possível olhar o céu e ver estrelas, ouvir os grilos e os pássaros, acordar com as ovelhas a irem pastar ao campo, coisas que um turista berlinense, londrino, nova iorquino, moscovita, paulista, parisiense não encontra na sua terra?!